Pesquisa investiga homens que fazem sexo sem preservativo.
 
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Um estudo realizado pelo psicólogo Luís Augusto Vasconcelos, da Universidade Federal do Vale de São Francisco, em Pernambuco, indicou e problematizou algumas das razões ou justificativas de homens brasileiros para correrem o risco de soroconversão nas práticas de barebacking – sexo anal desprotegido entre homens, de forma intencional. Os resultados, publicados na revista Cadernos de Saúde Pública da Fiocruz, apontaram que os praticantes buscam, mais do que adquirir HIV, sanar uma preocupação excessiva de acumular ou intensificar sensações.

O pesquisador analisou, por entrevistas online, a opinião de 30 homens de diferentes idades e regiões do país (principalmente São Paulo e Rio de Janeiro) que eram, predominantemente, profissionais de nível superior e estudantes universitários e que afirmaram praticar a modalidade de sexo, mesmo adicionando restrições ao conceito. Luís explica que muitos barebackers se dizem indiferentes ao status sorológico de seus possíveis parceiros, mas há uma diferenciação em relação a aqueles que são HIV negativo e procuram ser infectados pelo vírus, os chamados bug chasers.

“Esta diversidade de interesses reforça o argumento de que nem todas as pessoas querem, necessariamente, contrair o vírus, adoecer ou morrer, ainda que esta possibilidade seja, para alguns, uma forma de intensificar o prazer, sair da rotina ou mesmo uma maneira de se sentir mais livre e autônomo diante das preocupações, convenções e regras sociais”, esclarece o pesquisador. “Nesta perspectiva, colocar-se em risco parece, também, indicar que as pessoas buscam uma nova referência, uma marca que possa diferenciá-las, enfim, produzir sentido ou restaurar um valor para sua existência”.

Na pesquisa, as justificativas para as atitudes apareceram pautadas no uso da liberdade individual, ou seja, do direito de usar o corpo e obter prazer da forma que lhes convém. Segundo Luís, alguns praticantes estabelecem uma diferença entre querer se contaminar (de forma consciente) e se contaminar de forma acidental. “Eu não me importaria de fazer tratamento se acontecesse por um infortúnio, mas ter consciência de que vai acontecer, aí eu passo longe”, afirma um dos entrevistados. O pesquisador também comenta que alguns dos entrevistados ressaltaram não haver, como antigamente, tesão pelo risco, principalmente porque sabiam que ninguém morre de Aids nos dias atuais ou só falece caso negue fazer o tratamento. A doença é encarada de uma perspectiva otimista devido ao incremento de novas terapias anti-retrovirais.

Quanto à possibilidade de fazer o teste de HIV, alguns dos entrevistados disseram que não tem vontade de realizar o exame, pois o resultado não iria mudar sua prática. “Alguns dos meus interlocutores que se diziam soronegativos falavam da emoção produzida diante da trajetória de realização dos exames”, explica o pesquisador. “A cada novo resultado negativo, produzia-se uma satisfação pessoal como se estivesse ganhando o jogo. Nesta direção, se o teste desse positivo, o prazer que sentia ao desafiar o risco não iria mudar, pois seu objetivo era enganar o risco, ser superior a ele, inclusive mostrando-se mais forte que a própria infecção”.

Luís ainda destaca que, se a Aids passou a ser vista como uma doença crônica fazendo com que alguns se preocupem menos com a possibilidade de infecção, a própria probabilidade de soroconversão pode significar uma maneira de alterar a rotina ou de percebê-la de forma mais livre, sem preocupações. “Nessa perspectiva, acredito que seja interessante e produtivo discutir as mudanças de crenças em relação à severidade ou transmissão do HIV de modo mais convergente ou articulado com outras características e contextos da atualidade”, afirma o pesquisador.

Texto: Renata Moehlecke
Fonte: Agência Fiocruz de Notícias

 

 
 
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